domingo, 9 de setembro de 2018

 

Este País Não É Para Velhos

O título não é uma coincidência. Para quem viu Javier Bardem em toda a sua magnificência no filme adaptado de 2007 do livro com o mesmo nome, compreenderá a escolha deste tema. No entanto, a arbitrariedade do uso da moralidade através de uma simples moeda que é representada no filme não será totalmente transportada, em grande parte devido ao contexto apresentado.

No futebol, como em tudo na vida, as decisões são tomadas por padrões pré-definidos no contexto que se insere. O futebol português enquadra-se num contexto mundial de importação e refinação de talentos brutos de outras realidades futebolísticas – entre elas, a realidade anárquica em termos táticos brasileira – que nos permite receber jogadores que outrora raramente poriam os seus pés nos relvados portugueses.

Contudo, o problema está sobretudo no como e não no porquê. Acontece que em Portugal - como já descrito por outros contribuidores deste blog - o perfil de jogador no qual se aposta largamente foge ao que devia ser numa ótica de apresentar o melhor futebol possível, isto é, um futebol baseado no perfil de inteligência dos jogadores e por extensão, do seu treinador. De todos os cantos do mundo, principalmente do Brasil, importa-se jogadores com algum talento técnico mas sobretudo com “talento” físico.

O culto do jogador físico começa a assumir proporções nada saudáveis para um campeonato português que se deseja com qualidade. A aposta nos conceitos de intensidade, de garra, de jogador à X ou Y tem trazido cada vez mais jogadores que, mais do que futebolistas, são atletas. Não que ser atleta seja mau por si, mas ser só atleta e não também futebolista é claramente mau. Como exemplos, temos jogadores como Marega, Castaignos, Samaris, Raúl Silva, etc que fazem uso do físico no seu futebol em 90% das vezes que entram em contacto com o jogo, isto é, sem bola e com bola.

E deste contexto, depressa se retira a conclusão que, se o físico impera sobre a inteligência e a cultura tática, então devido à ordem natural do mundo, os jovens imperam sobre os velhos. É normal e esperado que os atributos físicos declinem com a idade. E também é normal que seja possível retirar resultados positivos com uma aposta declarada neste perfil de jogadores; o que não é normal é achar que não dá para ter os mesmos resultados positivos ou até melhor com uma aposta noutro perfil de jogadores que beneficiem a qualidade do jogo.

A inteligência não declina com a idade, e se sim, apenas será numa idade muito avançada, algo que não se coloca em causa no futebol. Portanto, é de uma estupidez brutal que na contratação de jogadores, o perfil delineado seja o do físico, e por consequente, o do jovem e não o perfil de inteligência com bola e sem bola do jogador, e por consequente, de qualquer idade.

Quando Casillas veio do Real Madrid para o Porto, cedo várias vozes surgiram a dizer que não era indicado para o Porto, porque era velho, porque era pequeno demais para guarda-redes, et cetera. Quando Mathieu veio do Barcelona para o Sporting, cedo vários grunhos surgiram a dizer que – guess what? - era velho para o Sporting, que tinha muitas lesões, et cetera. Quando Jonas veio do Valência para o Benfica, o mesmo se disse, como que de um coro pastoral se tratasse: era velho demais, que teve algumas lesões, que se fosse bom o Valência não o deixava sair a "custo zero", et cetera. 

No entanto, e após estes jogadores calarem os adeptos com a sua mais que indubitável qualidade, é quase unânime que fazem parte do núcleo duro de jogadores dos clubes mencionados. O jogador velho raramente existe em Portugal porque Portugal não quer. O jogador velho que exista é sempre olhado de lado. A não ser que tenha sido um grande jogador quando jovem, será sempre um a menos para o típico adepto picareta tuga.

A valorização do jogador velho não existe em Portugal sobretudo porque a mentalidade da maioria dos adeptos em Portugal é mentecapta. E diria eu também sintomática, dado que os dirigentes, aqueles com poder de decisão nos clubes, também sofrem da mesma maleita. Porque embora estejamos em 2018, muitas mentes perderam-se nos confins dos anos 80 ao som dos Xutos & Pontapés.

Está na altura deste país começar a apostar na qualidade, não só física, mas também técnica e tática e sobretudo, na inteligência do jogador. E os jogadores mais velhos podem muito bem fazer parte desse perfil. Está na altura de reduzir a arbitrariedade no perfil de jogador a contratar. Está na altura de dar aos adeptos bons jogadores e bom futebol como em tempos o campeonato português teve. 

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3 comentários:

  1. És novo, o Porkys é muito melhor e condiz com a mentalidade dos treinadores e dirigentes cá do burgo.

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  2. O País não é para velhos, mas também é difícil para os novos.

    Se houvesse uma aposta estratégica por parte dos clubes de utilizarem a Liga Portuguesa como montra e como forma de promoverem a chegada de talento internacional em trânsito para a Europa que paga bem e a horas, isso não traria grande mal ao mundo.

    O problema é quando a aposta se concentra em refugo, muitas vezes não tão jovem. Se a aposta em jogadores de potencial fosse combinada com a aposta em veteranos que passam o que sabem aos novos, poderia haver um nicho de mercado, nomeadamente ao nível da inserção de jogadores medianos Brasileiros.

    ...Só que como noutras coisas, o futebol português é um retrato fiel do país em que está inserido e a capacidade de planeamento fica a dever um pouco ao clubismo cego.

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