quinta-feira, 6 de setembro de 2018

 

Nacional 0 - Benfica 4 : O Homem do Jogo

O que é isso do homem do jogo? Em termos semânticos deveria ser aquele jogador que pelas suas acções mais contribuiu para que o jogo tenha tido o desfecho que teve. O problema de o definirmos desta forma é que abre espaço a diversas interpretações. In extremis, poderemos falar da mão de Abel Xavier, que só ficou para a História porque Zidane converteu o penalti que lhe sucedeu. Se Baía defendesse aquele penalti, falava-se era da defesa do Baía. Se o Zidane falha, do falhanço do Zidane. Aquele instante definiu um jogo e o homem do jogo foi aquele que, pela sua acção, imortalizou o momento. Podemos falar de Beto defesa central do Sporting que passou à posteridade como o homem que todos os anos ia para o Real Madrid e como o central goleador que com dois auto-golos decidiu um dérbi a favor do Benfica. E o minuto 92? Alguém se lembra de como nos anteriores 91 o Porto mal conseguia ligar dois passes seguidos? Alguém se lembra do sufoco a que o Porto estava a ser sujeito até que um tipo de vermelho não faz uma intempestiva entrada em tesoura a pés juntos e permite que aquele minuto suceda? Nada antes, nada depois, apenas aquele lance. E como se faz um tesoura a pés juntos?

O homem do jogo pode ser portanto alguém que não fez nada no jogo digno de nota, mas por ter conseguido atingir o nirvana da visibilidade na partida, é aquela figura que fica ligada a esse jogo. Algo de muito diferente de dizer que foi o melhor em campo.

No fundo não é muito diferente de dizermos que temos um colega que acorda cedo, chega a horas, cumpre com o que é pedido, mete mais uns pozinhos porque gosta do que faz, não deixa trabalho para depois e vai para casa satisfeito, com o trabalho feito. Também há o gajo que se atrasa, não cumpre prazos, não deixa falar mais ninguém, mas que no dia da visita da inspecção até conseguiu um brilharete qualquer. E portanto quando chega a hora do brinde é o homem do jogo e não o melhor em campo quem leva o bónus para casa.

Na recente deslocação do Benfica à Madeira a imprensa de bancada foi unânime em atribuir o prémio de homem do jogo a Sálvio. Prémio que se coaduna muito bem ao papel que o Argentino desempenha no Benfica. Sálvio é o homem do jogo todos os jogos! Porque com mais dois ou três neurónios funcionais, Sálvio poderia ser o melhor em campo, mas para ele está bom ser apenas o homem do jogo.

Para se perceber a diferença basta ver pequenas coisas. Sálvio está directamente ligado a dois golos e indirectamente a um terceiro (é ele que num acesso de lucidez toca a bola para Pizzi assistir Grimaldo). A juntar a estas teve uma arrancada pelo meio do terreno em que consegue ficar de frente para a baliza sem oposição na zona central. O motivo pelo qual este último lance não ficou devidamente assinalado no marcador é o motivo pelo qual Sálvio pode ser o homem do jogo e não ser o melhor em campo. É que Sálvio com a bola nos pés é, na maioria das vezes, um touro enraivecido na hora de marrar com os cornos. Quer isto dizer que os olhos dele estão pregados no chão, pensa-se que na bola, e portanto não vê nem quer saber do que o rodeia. E como não vê nem quer saber não se apercebe de quando tem espaço para progredir, não se apercebe do colega coberto, ou do colega desmarcado, ou de como vai rematar contra três adversários.

O Sálvio que o tribunal das bancadas, e alguma imprensa que devia perceber um pouquinho mais da lavra, elegeu como o homem do jogo foi-o porque as decisões acertadas que teve foram vistosas. O que se esquecem de contabilizar é as decisões erradas do Argentino. É que a primeira acertada é a assistência para Seferovic aos 23 minutos de jogo (mais coisa menos coisa). A segunda é o aparecer ao segundo poste para atirar a contar (mesmo assim a beneficiar de um trabalho de Gedson que fixa a defesa), já depois de ter falhado clamorosamente uma assistência adocicada do Suíço. Se a tolerância ao erro de Sálvio fosse igual à que se tem para com Zivkovic, Rafa ou Félix, a verdade é que Sálvio não passaria tempo suficiente em campo para ter uma boa decisão que fosse. Mas a Sálvio tudo se perdoa porque ele "tem golo" (apesar de um critério pior que o de Isaías) ou recupera muitas bolas (pudera, se as perdeu…). A única coisa que Sálvio tem que o recomenda é mesmo a estrelinha. No jogo da primeira mão com o PAOK Sálvio lesiona-se. A equipa cria sete ou oito ocasiões mas não concretiza mais do que uma. Na segunda mão com Sálvio, a equipa é incapaz criar metade das ocasiões, mas mete quatro batatas lá dentro, uma delas oferecida pelo Marco Tabuadis (não quero sequer ir procurar o nome dele) que evitou a goleada uma semana antes.

O que foi o jogo de Sálvio para lá da assistência e do golo? Passes curtos falhados, passes médios falhados, passes longos para fora, remates contra adversários, remates desconexos, olhos na bola e alheamento da equipa. Homem do jogo pelas esperanças que deu ao Nacional, só se for!
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